segunda-feira, maio 31, 2010

chave.

Apesar das recomendações sobre que isto pode me adoecer, eu tenho pensado nele sim.Não só imaginado, mas sentido, provado como num sonho cheio de sinestesia.Tenho me olhado no espelho e conseguido te ver pedaço por pedaço letra por letra verbo por verbo.Apesar de me dizerem que não posso te sentir com minha pele eu tenho sim tentado te tocar como criança pequena tenta guardar uma brisa com os mãos.E eu me concentro nesse exercício nem sempre saudável de tentar com todos os meus recursos estar mais perto ,cada vez mais perto de você para ver se crio novas memórias para este corpo cansado.


Olá meu futuro.Eu não quero desistir de te provar nunca.

terça-feira, maio 25, 2010

dois dias.

Tomei banho mas não fui capaz de me vestir.Percebi que no frescor da minha nudez é que meu corpo se demonstra pronto pra ser visto.Me enxergue.
Posso ver também com clareza que o amargo pode ser servido em lindos papéis de presente.
E que a doçura vem tão singela que as vezes a ignoramos, pensando ser um mendigo.

quarta-feira, maio 19, 2010

textos

Meu corpo também é texto


e é nele


que linha por linha


vou escrevendo aos poucos todos os modos de ser tua.

sexta-feira, maio 14, 2010

paul michel foucault

 Esse é um dos meus textos prediletos.É comprido para este mundo corrido de blogs e de típicos comentários blogueiros e talvez esse blog não seja um blog para os outros mas muito mais pra mim.Eu gosto de vir e olhar todos os meus gostos em todos os detalhes.

De todo modo a reflexão  de foucault é única em termos de profundidade e concisão.Vale sempre a perna ser lido


Marcelo Coelho traduziu parte de uma conferência ainda inédita de Michel Foucault, chamada Le corps, lieu d´utopies (de 1966)( o corpo lugar de utopias)


Basta eu acordar, diz Foucault, que não posso escapar deste lugar, o meu corpo. Posso me mexer, andar por aí, mas não posso me deslocar sem ele. Posso ir até o fim do mundo, posso me encolher debaixo das cobertas, mas o corpo sempre estará onde eu estou. Ele está aqui, irreparavelmente: não está nunca em outro lugar. Meu corpo é o contrário de uma utopia. Todos os dias, continua Foucault, eu me vejo no espelho: rosto magro, costas curvadas, olhos míopes, nenhum cabelo mais... Verdadeiramente, nada bonito. Meu corpo é uma jaula desagradável. É através de suas grades que eu vou falar, olhar, ser visto. É o lugar a que estou condenado sem recurso.
É possível que contra esse corpo tenham nascido todas as utopias, dele nasce a utopia original --a de um corpo incorporal: o país das fadas, dos elfos, dos gênios, onde as feridas se curam imediatamente, onde caímos de uma montanha sem nos machucar, onde podemos ficar invisíveis.
Há outra utopia dedicada a desfazer o corpo é o país dos mortos. A múmia é o corpo utópico que desafia o tempo. Há as pinturas e esculturas dos túmulos, que prolongam uma juventude que nunca vai passar, que será eterna. Meu corpo se torna sólido como uma coisa, e eterno como um deus.
A outra, a maior utopia criada contra o corpo é o grande mito da alma, que funciona maravilhosamente dentro do meu corpo, mas escapa dele. É bela, pura, branca, ao contrário do meu corpo. Durará para sempre. É meu corpo luminoso, purificado.
Assim, pela mágica dessas utopias, meu corpo pesado e feio desaparece magicamente. Recebo-o de volta fulgurante e perpétuo.
Mas meu corpo, nele mesmo, seus recursos próprios de fantástico. Tem lugares sem-lugar. Tem seus lugares obscuros e praias luminosas. Minha cabeça é uma estranha caverna, com duas aberturas, meus olhos. E, se as coisas entram na minha cabeça, ficam ao mesmo tempo fora delas.
Corpo incompreensível, penetrável e opaco, aberto e fechado: corpo utópico. Absolutamente visível --porque sei o que é ser visto e ver os outros. Mas esse corpo é também tomado por uma certa invisibilidade: minha nuca, por exemplo. Minhas costas: conheço seus movimentos, sua posição, mas não as vejo. Corpo que é um fantasma, que só posso ver pelo truque, pela miragem de um espelho.
Esse corpo não é uma coisa: anda, mexe, quer, se deixa atravessar sem resistências por minhas intenções. Só quando estou doente –dor de estômago, febre--  ele se torna coisa, opaca, independente de mim.
Não, o corpo não precisa de fadas e almas para ser utópico, visível e invisível, transparente e concreto. Para que eu seja utopia, preciso apenas ser... um corpo. As utopias não apagam o corpo: nasceram dele, para só depois, talvez, voltarem-se contra ele.
Uma coisa, entretanto, é certa: o corpo humano é o ator principal de todas as utopias. O sonho de um corpo imenso, o mito dos gigantes, de Prometeu, é uma utopia. O sonho de voar também.
O corpo é também ator utópico quando se pensa nas máscaras, na tatuagem, na maquiagem. Não se trata, aqui, propriamente, de adquirir um outro corpo, mais bonito ou reconhecível.
Trata-se de fazer o corpo entrar em comunicação com poderes secretos, forças invisíveis. Uma linguagem enigmática e sagrada se deposita sobre o corpo, chamando sobre ele o poder de um deus, a força surda do sagrado, a vivacidade do desejo. Fazem do corpo o fragmento de um espaço imaginário, que entra em comunicação com o universo dos outros, dos deuses, das pessoas que queremos seduzir.
O corpo é arrancado de seu espaço próprio e arremessado a um outro espaço. As vestimentas religiosas, por exemplo, fazem o indivíduo entrar no espaço cercado do sagrado, ou na comunhão da sociedade. Tudo o que toca no corpo, uniformes, diademas, faz florescerem as utopias internas do corpo.
E a carne nela mesma pode ser também utópica. Faz o corpo voltar-se contra si: o outro mundo, o contra-mundo, penetra nesse corpo, que se torna produto de seus fantasmas: o corpo de um dançarino, por exemplo, é um corpo dilatado pelo espaço –espaço que lhe é interior e exterior ao mesmo tempo. O corpo do mártir acolhe a dor e a salvação. O corpo de um drogado, de um possuído, de um estigmatizado, recebe em si o que lhe é exterior.
Bobagem dizer portanto, como fiz no início, que meu corpo nunca está em outro lugar. Meu corpo está sempre em outro lugar. Está ligado a todos os outros lugares do mundo, e está num outro lugar que é o além do mundo. É em relação ao corpo que existe uma esquerda e uma direita, um atrás e um na frente, um embaixo e um em cima.
O corpo está no centro do mundo, nódulo utópico a partir do qual penso, sonho, me comunico. O corpo, como a Cidade de Deus, não tem lugar, e é de lá que se irradiam todos os lugares possíveis.
Apenas o espelho e o cadáver selam e calam essa voragem utópica. Os dois estão num outro lugar impenetrável, mas nesse momento já não sou eu mesmo. Para que eu seja eu mesmo, no meu corpo, sem utopia, é preciso uma situação bem definida. Só o ato amoroso, quando nos entregamos a ele, acalma a utopia do nosso corpo: por isso é tão próximo, no imaginário, ao espelho e à morte. É porque só no amor o meu corpo está AQUI.

quarta-feira, maio 05, 2010

Serpentes.


Eu tenho uma natureza orgulhosa.Orgulhosamente fechada.E um não sei que de tristeza vem sempre me invadindo quando menos espero.Me abraço a ela.Crio um apego de mãe pela cria,porque imploro por sentir algo.E quando menos espero estou eu e ela unha em carne,num entrelaçamento sensual que sequer sou capaz de distinguir ela de mim.como duas serpentes mordendo a mesma maçã de eva permaneço por horas nesse quadro apático e frio que nem mesmo o calor da manhã e do dia que amanhece inteiro entre carros palavras e passos faz dissipá-lo.
Você ainda está em mim.

(A.C.Silva)







 É evidente, em primeiro lugar, que me está vedado pedir. Pedir que não anoiteçam meus olhos seria loucura; sei de milhares de pessoas que vêem e que não são particularmente felizes, justas ou sábias. O processo do tempo é uma trama de efeitos e causas, de sorte que pedir qualquer mercê, por ínfima que seja, é pedir que se rompa um elo dessa trama de ferro, é pedir que já se tenha rompido. Ninguém merece tal milagre. Não posso suplicar que meus erros me sejam perdoados; o perdão é um ato alheio e só eu posso salvar-me. O perdão purifica o ofendido, não o ofensor, a quem quase não afeta. A liberdade de meu arbítrio é talvez ilusória, mas posso dar ou sonhar que dou. Posso dar a coragem, que não tenho; posso dar a esperança, que não está em mim; posso ensinar a vontade de aprender o que pouco sei ou entrevejo. Quero ser lembrado menos como poeta que como amigo; que alguém repita uma cadência de Dunbar ou de Frost ou do homem que viu à meia-noite a árvore que sangra, a Cruz, e pense que pela primeira vez a ouviu de meus lábios. O restante não me importa; espero que o esquecimento não demore. Desconhecemos os desígnios do universo, mas sabemos que raciocinar com lucidez e agir com justiça é ajudar esses desígnios, que não nos serão revelados.

Quero morrer completamente; quero morrer com este companheiro, meu corpo.

(jorge luís borges)